Venid, se amos locos todos juntos*
Conta o historiador Christopher Hill que, no Século XVII, inúmeras pessoas, na Inglaterra, fingiam sofrer de alguma deficiência mental.
Tornara-se costume interná-las em um manicômio em Bedlam.
Apesar do uso da internação dos lunáticos em hospício, o número destes mostrava-se imenso.
Nas estradas e bosques do país, perambulavam pessoas que se punham a falar coisas extravagantes.
Previam o futuro.
Expunham os erros dos magistrados e dirigentes públicos.
Lembra ainda o historiador que, agindo como dementes, os bufões da Corte diziam aos soberanos verdades proibidas às pessoas comuns.
Agiam os bufões como verdadeiros conselheiros dos reis e rainhas.
Conclui o historiador que, quando os bufões foram afastados, os equívocos dos dirigentes tornaram-se maiores.
Não havia quem censurasse os equívocos.
Uma surpreendente afirmação expende o historiador inglês:
Muitos fingiam-se de loucos.
Assim podiam expor ideias políticas de oposição aos governantes.
Estas censuras, exposta por pessoas normais, seriam objeto de severas penas.
Dai os mais sagazes fingirem-se de loucos para livremente exporem, nas praças e nos templos, discursos proibidos aos considerados normais.
Assim, a demência, na Inglaterra do Século XVII, tornou-se em veículo político.
Criou espaço para novas concepções religiosas e, inclusive, governamentais.
Oportuno lembrar que todos estes episódios se verificaram como antecedentes da Gloriosa Revolução Inglesa.
Ridículo e escarnio, fazer papel de louco, foram considerados, naqueles tempos, dos melhores instrumentos para polemizar.
As constatações elaboradas pelo historiador conduzem, sem maior esforço, a uma comparação inevitável.
Estaremos, no Brasil, também utilizando a prática avoenga dos ingleses na ação política?
Ou seja, muitos se fazem de loucos para poder agir e expor as mais estranhas colocações.
Terá se tornando o Brasil, como a velha Inglaterra, em uma grande casa de loucos.
É possível.
Para aquilatar esta possibilidade, basta ler um jornal ou assistir um noticiário de televisão.
Os bufões de todas as espécies estão presentes.
Falam tolices sem qualquer censura.
Fazem-se de loucos.
Como diria o homem do Eclesiastes:
Não há nada de novo debaixo do sol.
O Brasil do Século XXI emita os ingleses do Setecentos.
Temos falsos loucos a toda prova.