*Os vícios privados fazem a prosperidade pública.
Os estudiosos de Ciências Políticas referem-se, na maioria das vezes, aos mesmos autores.
São considerados clássicos.
Esta deformação conduz a uma deficiência de conhecimento e a uma visão oblíqua da realidade.
Repetem-se as mesmas frases e os mesmos autores a exaustão.
Esquecem figuras altamente relevantes que, em diversas épocas, souberam aquilatar a natureza humana.
O ser humano, em sociedade, adquire vícios difíceis de serem estirpados.
Eles permanecem independente do tempo e dos lugares.
Quando, nestes trópicos, surge uma onda de moralidade,há, entre as obras esquecidas pelos estudiosos nativos, uma que causa alta perplexidade.
Trata-se da produção de autor holandês, com grande parte de sua existência desenvolvida na Inglaterra.
O estudo desta obra permite o entendimento do grande progresso recolhido pelos ingleses no Século XVIII.
Nesta época, surgia na Inglaterra o pensamento utilitarista.
Este provocou, por parte dos puritanos, uma enorme onda de indignação.
Surgem, neste período, as obras de Stuart Mill, Bacon, Locke e Hume.
Foram personalidades que permitiram o equacionamento da democracia e a concepção do que, mais tarde, se chamou capitalismo.
Os trabalhos destes autores causaram alterações de rumo nos campos político, religioso e econômico.
Não produziram, todavia, revolta ou indignação.
Estas explodiram com a obra máxima de Bernard Mandeville, “A fábula das abelhas”.
É trabalho polêmico.
Repleto de ironias.
Amplo em observações sobre o cotidiano das pessoas.
Mandeville defendeu tese paradoxal.
O vício permite o progresso.
A moralidade absoluta leva à estagnação.
Suas críticas se estende, em um girar de observações, a tudo e a todos, especialmente aos moralistas.
Defende uma sociedade regida pelas leis, tal como as abelhas, pois estas
… não são escravas da tirania,”
nem as rege a louca democracia
Vai além Mandeville.
Agride os advogados, como geradores de demandas intermináveis:
Tudo para encher as mãos de honorários …
como ladrões de lojas e casas.
Sobra para os médicos:
valorizam a riqueza e a fama, mais que a saúde de seus clientes.
E os juízes,
mesmo que sendo honestos, nunca apresentam o que ganham.
O pior.
Mandeville defende o vício como indutor das riquezas.
A virtude gera a pobreza.
Registra, sem censura, ser a avareza um vício maldito, perverso e pernicioso.
Enquanto o luxo dá trabalho a milhões de pobres.
Prossegue:
Nenhum homem de honra pode viver e conformar-se com viver devendo o que ganha.
Não teme em proclamar:
Fraude, luxo e orgulho devem viver,
Enquanto desfrutamos de seus benefícios.
O vício é benéfico – continua – quando a Justiça o poda e o limita.
E atinge a obra de Mandeville, seu ápice, quando ao seu término, não tem o pudor de afirmar:
“… se quiserem reviver a Idade de Ouro,
terão que se libertar da honradez como das balas”.
Bernard Mandeville, um cínico, pela sua audácia foi objeto de censura pública e réu em processos.
O seu pensamento, em época de extravagante onda de moralidade, merece ser objeto de reflexão.
Ele não pensou diferente dos nossos antepassados do Século XVI, que, em seus provérbios, apontavam:
“Ditoso é o mal que tanto bem traz”
É possível que os milhares de desempregados, pelo Brasil afora, estejam meditando tal como fizeram Mendeville e os portugueses do Século das Descobertas.
No decorrer dos tempos, muitos navegaram contra a corrente.
Causaram – e causam – perplexidade.
Fazem pensar.