Arquivos diários: 14 de novembro de 2016


O SURPREENDENTE RESULTADO DAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS AMERICANAS

 A história se repete.

 

Uma geração passa, outra vem, e o mundo é sempre o mesmo (Eclesiastes,1,4)

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Pois é, mudam a moda, os penteados, os cenários, os ambientes; fatos e fenômenos da história, contudo, se mostram persistentes em não se volatilizar e em, periodicamente, retornar da hibernação, contestando as técnicas cada vez mais sofisticadas que o século XXI descortina, assustando especialistas, formadores de opinião e aniquilando suas análises e recomendações.

O resultado das eleições presidências norte-americanas, que proclamou Donald Trump como o grande vencedor dessa acirrada e tempestuosa disputa, revela exatamente a ignorância – premeditada ou não – de  ocorrências muito similares do passado. As pesquisas, os comentários que a mídia e a imprensa estampam no período que antecede o pleito propagam um determinado resultado, que entendem o mais provável; as urnas insistem, todavia, em não atender a estas previsões e, passando por cima delas, apontar resultados destoantes daquelas projeções –  surpreendentes.

Mas, a quem surpreendeu? Ao eleitor, certamente não. Este – como já referido antes – incorporou o papel de jogador com veto no mundo democrático. Consciente de sua relevância na produção da decisão política, este exerce a cidadania e se utiliza de todos os instrumentos a sua disposição; inclusive do poder de sufrágio, in casu do poder de eleger o seu Presidente.

Deixou em posição de puro espanto, no entanto, os responsáveis por pesquisas eleitorais, comentaristas, colunistas políticos, analistas, observadores internacionais, personalidades do mundo político, acadêmico e jornalístico. Ao eleitor, esta figura que incorporou todo o seu potencial de veto no jogo pelo poder que o processo eleitoral ilumina,  não causou estranheza, até porque este eleitor manteve-se fiel ao seu voto. Enrustido, acanhado, intimidado – porém fiel à expectativa de mudança, de reorientação das políticas públicas.

Situação muito similar ocorreu aqui no Brasil, em um lugar não muito distante da realidade yankee; em uma grande metrópole, uma cidade tão cosmopolita como Nova York. Em São Paulo, no ano de 1985.

Era o pleito municipal para a escolha do prefeito e de seu vice. E pasmem: todas as pesquisas – inclusive as de boca de urna, realizadas ao longo do dia das eleições – mostravam a vitória de um candidato. O mais jovem, o mais simpático, o mais envolvente. O candidato da mídia e do prefeito que detinha o cargo naquele momento. E, este candidato, empolgado com a sua densa penetração eleitoral, propagada pela mídia, chegou a se antecipar com as sessões de fotos oficiais; na pressa de assumir o governo da mais importante cidade brasileira, aceitou e posou para fotógrafos sentado na cadeira do Prefeito. Tornou-se capa de revista. Quando esta passou a circular, contudo, trazendo o candidato nobremente sentado na poltrona prefeitural, a vitória das urnas já tinha contemplado o outro candidato. E Jânio Quadros se tornou prefeito de São Paulo, com o voto enrustido, acanhado, intimidado do eleitor paulistano, que – até em 1985 – detinha plena consciência do seu papel de jogador com poder de veto.

É verdade que se trata de história do século passado. Mas não deve ser desprezada. Porque a história se repete e não tem compaixão com os que tentam mantê-la em escaninho hermeticamente fechado.

É verdade também que há forte tendência em afirmar que as pesquisas e enquetes podem vir a influenciar o voto. Isto diante da expectativa do eleitor de estar junto com o vencedor. The winner consagra uma figura admirada. Mas já no meu livro Sistemas Eleitorais X Representação Política[1], deixo claro este novo posicionamento do corpo eleitoral, ciente da força política de que é detentor. Ele constrói suas candidaturas, as apoia e robustece com o seu voto, ainda que sigiloso e abafado pelo poder da alta tecnologia que os meios de comunicação e de compartilhamento modernos praticam.

[1] Livro publicado pelo Senado Federal em 1990.


BIG STICK

THE PEOPLE, YES *

Fracasso da soberba. eua

Este é o sentimento que aflora após as eleições presidenciais norte-americanas.

A maior parcela dos meios de comunicação dos Estados Unidos adotaram uma candidatura e, galopando a soberba, conferiram-lhe vitória.

Esqueceram-se de consultar uma variável fundamental nas democracias: o povo.

Não aconteceu um resultado inesperado.

Ao contrário, quem conhece um mínimo da Historia dos Estados Unidos captaria previamente a vontade da sociedade.

Um povo acostumado à luta e a conquistas, a partir do trabalho individual, não aceita passivamente a visão dos politicamente corretos.

É do início do Século XX a dura posição política dos dirigentes estadunidenses a respeito de temas internos ou externos.

A frase símbolo desta época de grandeza imperial é a significativa:

“Fale mansamente e dê uma grande bengalada e assim chegarás muito longe”.

Manteve-se este posicionamento no inconsciente coletivo dos Estados Unidos profundo.

Aflorou intensamente após o desenrolar de uma série de frustrações.

A Guerra da Coréia, a tragédia do Vietnam, as falsidades quanto ao Iraque, apenas para arrolar, como exemplo, alguns colapsos no cenário externo.

Internamente, a presença útil e ao mesmo tempo perturbadora de hordas de imigrantes ilegais.

Some-se a perda de empregos no espaço industrial.

Agregue-se ainda a ausência de efetividade nas políticas do Estado do Bem Estar.

Tome-se às irregularidades do sistema financeiro.

Estes fatores conduziram a uma grande depressão.

Os analistas – cientistas políticos, professores universitários e frequentadores de redações – ausentes da realidade cotidiana, foram incapazes de captar os sentimentos populares.

Daí recolhe-se uma lição amarga e altamente preocupante.

Os meios de comunicação e os intelectuais precisam deixar suas torres de marfim.

Precisam retornar à planície.

Caso contrário, estarão fadados a crescente descrédito.

A democracia precisa de formadores de opinião pública capacitados e isentos.

As posições partidárias devem ser deferidas aos políticos.

Eles possuem, como atributo, a criação de correntes de pensamento.

Os comunicadores e pensadores devem se ater a análise isenta e veraz dos acontecimentos.

Não podem assumir o papel de condutores de verdades absolutas.

Erram.

O pior, levam lições constrangedoras da sociedade.

Nas democracias, as pessoas agem com independência e liberdade.

A vitória de um candidato execrado pela mídia e pela intelectualidade não é fenômeno novo em nenhuma parte.

Lamenta-se que a lição dos eleitores não é recolhida com humildade por alguns iluminados.

Na democracia só existe um senhor: o colégio eleitoral.

Os falsos sábios escondem-se em suas roupas informais. Longe das pessoas comuns.

Fogem dos embates diretos.

Recolhem-se em cenários herméticos.

Falam entre si.

Querer impor suas vontades.

Só apresentam obscuridades.

Estão sempre a errar.

Os norte-americanos deram uma dura lição aos falsos intérpretes do povo.

 

*Livro de poesias de Sandburg