Arquivos diários: 18 de janeiro de 2016


PERPLEXIDADE

A perplexidade avançou sobre a sociedade. Uma descrença generalizada tomou todos os poros da coletividade. Nenhum setor ficou fora deste clima de indagação.

O que será o dia de amanhã? As notícias geradas em Brasília – ou em Curitiba – não trazem nenhum alento. Só episódios negativos. Algumas personalidades públicas, guardiãs dos valores republicanos, transmudaram-se em quadrilheiros vulgares.

Um dia a vida política contou com pro homens capazes de sacrificar seus interesses particulares em defesa do bem comum. Nada de falcatruas.

Hoje, rara é a personalidade pública que pode se apresentar nos espaços da cidadania. Há um clamor generalizado. Uma reprovação ilimitada.

Mudaram os costumes. A velha sociedade rural – repleta de incongruências – possuía, particularmente na região meridional, uma profunda simplicidade de costumes.

A casa grande dos paulistas era sóbria e a pobreza era o traço dominante. Basta ler os velhos inventários constantes do Arquivo Públicos do Estado de São Paulo.

Os brasileiros não tinham hábitos consumistas. Eram espartanos. Longe do litoral sempre se caracterizaram pela modicidade. O luxo invadiu suas vidas a partir do Século XIX.

No Brasil independente, antes no Rio de Janeiro, capital do Império e da República, depois, e com maior intensidade, em Brasília a ostentação substituiu a parcimônia.

Terra de aluvião social, Brasília recebeu pessoas de todas as regiões com o objetivo de galgar melhorias em suas vidas. O código novo de conduta surgiu.

E preciso vencer. Como em Brasília as atividades privadas são insignificantes, a estrutura do Estado foi paulatinamente sendo ocupada.

Milhares de cargos em comissão, de livre nomeação, portanto, pululam no cenário público. Antes a obtenção do cargo, depois o acréscimo de mil penduricalhos.

Este é o processo que, vagarosamente, vai corroendo as verbas públicas. Não há arrecadação suficiente para contemplar este mar de concessões.

Foi-se além. Permitiu-se, em todos os níveis federados, a ocupação dos espaços administrativos pelas empreiteiras. Nada de planejamento estratégico estatal.

Quem manda é o particular. O Estado é mero pagador. Não possui planos. Não aponta prioridades. Ao governante resta a farsa da inauguração.

Agravaram-se ainda mais os costumes na Capital Federal graças ao traçado do Plano Piloto. A Praça dos Três Poderes deveria ter outro nome.

Muito melhor se a denominação fosse Praça da Promiscuidade. Os membros dos poderes da República encontram-se uns dos outros a pouca distância.

Cruzam a todo o momento. Freqüentam os mesmos espaços sociais. Idênticos restaurantes. Os mesmos clubes. O excesso de proximidade gera inevitável intimidade.

A par do retorno aos costumes sóbrios do Brasil profundo, seria oportuno que o Poder Judiciário deixa-se o Planalto e se deslocasse para outra cidade.

Os alemães – sabiamente – levaram as cortes judiciais para longe de Berlim.  Os assuntos administrativos e legislativos se produzem na histórica Capital e os judiciais se resolvem em Karlsruhe, em Baden-Wurttemberg.

Os magistrados são, assim, preservados de contatos interesseiros e quase sempre desconfortáveis.

Brasília conta com inúmeros inconvenientes, mas certamente o mais grave é o convívio inoportuno entre membros dos Poderes.

São tantos os equívocos atuais de nossa sociedade que os enumerar é tarefa hercúlea. Seria bom exercício de paciência se cada brasileiro elaborasse sua própria relação.

 

 

 


O NOVO BRASIL

Os historiadores registram que a conciliação sempre ocorreu após os grandes conflitos de posições aqui no Brasil.

Foi no passado. Hoje a conflagração é geral. Os debates se mostram profundamente preconceituosos.

Parece que o bom senso sumiu da cena política.

Claro que esta nova situação, onde transação e a conciliação se encontram ausentes, deve contar com uma explicação.

Esta não é difícil de se alcançar. Basta uma observação sensível do atual quadro social nacional.

Durante séculos, fomos uma sociedade agrícola. Grande parte de nossa população encontrava-se dispersa pelas imensidões do território.

O jogo político se constituía em um minueto entre segmentos de uma mesma classe social. A política era uma atividade dos bem postos na vida.

Com a migração interna, grandes contingentes populacionais se deslocaram para as mais diferentes regiões do País.

A miséria – antes distribuída por vazios demográficos – se concentrou na periferia das cidades. Grandes ou pequenas.

As reivindicações tornaram-se dispersas e de natureza social. Já não são os fazendeiros de café que buscam nos gabinetes favore governamentais.

Muito menos usineiros endividados batem na porta dos bancos oficiais. Montadoras já não buscam de incentivos fiscais.

É a comunidade que, por toda a parte, pede por moradia, saúde e trabalho. Tudo mudou. O que restou das velhas elites não se conforma.

Não aceita os resultados eleitorais. Deseja transformar remédios constitucionais extraordinários em mera verificação de poderes, tal como acontecia na República Velha.

É bom recordar. Na República de 1889, após o pleito eleitoral, reunia-se o parlamento para verificar os resultados dos pleitos.

Aí, então, os inimigos do Executivo sofriam a degola. Os mandatos obtidos, mediante o voto popular, direto e secreto, eram desconsiderados.

Um horror. Hoje, segmentos minoritários da sociedade querem agir como no interior daquela República que desapareceu com a Revolução  de 30.

É um equívoco. Os tempos mudaram. Os costumes políticos se alteraram. Há por toda a parte reivindicações e protestos.

A comunidade se movimenta. Começa a surgir, a cada dia mais, o sentimento de cidadania.

Ou seja, o de pertencer a uma coletividade e, no interior desta, lutar por direitos e avanços sócias.

Só os tolos ingressam em aventuras antidemocráticas. O rompimento da vontade popular expressa pelo voto é um risco imenso para a democracia e para a própria paz social.

É preciso fiscalizar os governantes. Exigir moralidade no trato da coisa pública. Permitir que as instituições funcionem adequadamente.

Preservar a autonomia do Judiciário. Garantir o bom funcionamento do Legislativo. Aguardar comportamento leal do Executivo.

Quando estes Poderes estiveram funcionando livre e harmonicamente é conquista a ser  preservada .

Não há mais lugar para acordos entre facções das velhas oligarquias. É  resquício de um passado que se foi. Felizmente.

Cabe preservar a democracia. Ter consciência da importância da transparência nos negócios públicos.

Proclamar sempre a necessidade de moralidade no exercício das funções públicas. Saber que tudo se faz dentro da lei, nada fora da lei.

Com a preservação deste valores, vamos avançar e consolidar uma verdadeira democracia. Sem retorno ao passado, amargo sob todos os aspectos.