BREVE OPINIÃO SOBRE JUÍZO POLÍTICO


1. A partir dos anos 90, os clássicos golpes militares endêmicos na América Latina deixaram de acontecer. Novas condicionantes externas – o fim da Guerra Fria – levaram a redemocratização de todos os países da região.

2. Deixaram os segmentos tradicionais das sociedades indo- americanas de se socorrerem dos quartéis para a derrubada de governantes democraticamente escolhidos.

3. Uma nova forma de intervenção, por parte dos segmentos consolidados, passou a acontecer. Trata-se do Juízo político ou, como é mais conhecido entre nós, o impeachment.

4. O instituto tomou espaço, em nosso Direito Constitucional, desde a Constituição de 1891, a primeira republicana. Foi importado do constitucionalismo norte-americano.

5. O seu desmedido uso, nas últimas décadas, por toda a América Ibérica demonstra uma nova patologia no cenário político. O desrespeito da vontade popular por meio de processos aparentemente regulares.

6. Estudos contemporâneos apontam para a queda de dez presidentes latino-americanos, por meio de juízos políticos, até o ano de 2007. Diante desta anomalia, autores indagam: Los juicios políticos,son un equivalente funcional de los antigos golpes militares? (1)

7. É questionamento preocupante. Porque? As personalidades objeto de juízo político são figuras escolhidas por meio de eleições livres e democráticas, onde se verificaram debates e exposição de idéias.

8. Os resultados destas eleições correspondem à vontade popular recolhida por meio de instrumento essencial e impostergável em uma democracia, pois é de sua essência, o voto livre, secreto e universal.

9. Como próprio da democracia, no pleito, por maioria de votos,um candidato, titular destes sufrágios,é investido pela sociedade da tarefa para implementar programas e políticas públicas.

10. Todo movimento contrário ao resultado eleitoral indica fragilidade ética por parte de seus autores, pois, em última razão, estão em busca de fraudar a vontade popular.

11. Devem os adversários se utilizar das práticas oposicionistas nos parlamentos, mas não podem violar o encaminhamento legítimo da vontade advinda das urnas.

12. Autor clássico, registra: os patriarcas da República norte-americana, tendo de escolher entre a responsabilidade imperfeita do presidente e os males gravíssimos que infalivelmente arrastaria a intervenção legislativa, mostraram uma sabedoria assegurando a independência do poder executivo. (2)

13. Não podem as oposições esgrimir, como loucos espadachins, com requerimentos, aqui e acolá, de impeachment. Levam a instabilidade aos negócios de Estado e a insegurança ao cenário econômico.

14  Agem, desta forma, de maneira duplamente ilegítima, pois fragilizam instituições fundantes da democracia contemporânea: o livre curso dos poderes da República.

15 Cabe ainda ponderar que o juízo político, para ser plausível, exige a prática pessoal de crime de responsabilidade por parte do titular do cargo público relevante.

16 O ato apontado deverá ser praticado pelo próprio agente político. Não por terceiros, mesmo que seus subordinados diretos. Terá que contar com expressa tipificação legal e deverá conduzir ao enriquecimento pessoal do agente.

17 Quando nada disto acontece, não há que se falar em impeachment. Será a utilização de um instrumento altamente sensível para tratar de situações pessoais de desagrado.

18 Qualquer afastamento de pessoa investida de função pública – ensina Pontes de Miranda – por eleição, investidura que vem do povo, só se permite, nas democracias, em extrema necessidade. (3)

19 Lembra ainda o consagrado jurista – gizando o tema – que, no campo do juízo político, não há crime de responsabilidade, sem lei que o defina, como é inerente ao Direito penalizador.

20 Não pode ser olvidado – ainda uma vez – que o respeito ao voto popular é essencial à manutenção da democracia e seu desrespeito, por intermédio de argumentos subjetivos, é altamente pernicioso a sua preservação.

21 A lei n. 1.079, de 1950, que trata dos crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento, uma única vez foi utilizada no decorrer da República e as consequências de sua aplicação até hoje são objeto de reflexão. O ato praticado pelo Congresso – pelas suas duas casas –a posteriori foi objeto de reanalise pelo Poder Judiciário.

22 Os efeitos, no entanto, de sua aplicação não foram revertidos, o que gerou uma solução de continuidade no processo político pátrio.

É minha opinião, s.m.j.

Autores citados, pela ordem:

 

(1) Anibal Perez-liñán

Juicio político al presidente y nueva inestabilidade política en América Latina.

Fondo de Cultura Economica

1ª. Edição em espanhol 2009

 

(2) João Barbalho

Commentarios a Constituição Federal Brazileira

Litho-Typographia – 1902

 

(3) Pontes de Miranda

Comentários à Constituição de 1946

Max Limonad

2ª edição  1953

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