YVY MARANE’Y


Uma visita ao Paraguai permite rever muitas tradições comuns aos valores plasmados por paraguaios e brasileiros. Ambos os povos se integram. Descendem das populações que formam a nação tupi-guarani.

Esta se lança desde o sul da Venezuela até a Argentina e constitui um coeso grupo humano ligado por uma mesma língua: o guarani. Além deste elemento, anterior à presença européia, há mais.

Os jesuítas portugueses, desde 1552, buscavam autorização de seus superiores para se agregarem a seus companheiros instalados no Paraguai.

Os bandeirantes, em época posterior, atingiram as missões jesuíticas com o escopo de romper a hegemonia da Companhia de Jesus no sul do continente.

Os brasileiros e os paraguaios sempre mantiveram vinculações profundas. Os fatos, além das margens do Paraná e do rio Paraguai, se refletem, de maneira recíproca, em ambas as comunidades.

As caminhadas dos guaranis entre os dois espaços – o paraguaio e o brasileiro – apresentaram-se como constantes. As práticas religiosas ainda possuem traços de analogia. O pensamento médio dos dois povos conta com filosofia semelhante.

Paraguai e Brasil, como nunca, hoje se encontram vinculados por relações culturais profundas e interesses econômicos relevantes. Tudo que ocorre no país vizinho repercute no Brasil. Mesmo que imperscrutavelmente.

A mesma afirmação vale em sentido contrário. Os acontecimentos políticos e econômicos presentes na sociedade brasileira se refletem no jogo político e nos interesses econômicos dos paraguaios.

É bom, pois, sempre se observar o que ocorre na outra margem do rio Paraná, porque fatos e personalidade presentes no Paraguai podem gerar reflexão e acontecimentos no Brasil.

Como os brasileiros, quando alguém morre, dizem chegou seu tempo. Não temem o perigo. Ninguém morre na véspera. O compadrismo e o nepotismo encontram-se nos dois povos.

Todos admiram o Estado e do Estado procuram retirar sustento para si e para os seus. Leis cósmicas o manterão como um deus visível e capaz de praticar ações de benemerência. Confere a todos, tudo.

Não importa o preço. Deus – o invisível – proverá. Estes posicionamentos, muito próximos do agir brasileiro, permitiram aos guaranis conceber um dístico para seu país: a Terra sem Mal, o yvy marane’y *.

Ou seja, uma raiz para a afirmação nacional: Deus é brasileiro. Este Deus, comum aos paraguaios e brasileiros, por vezes, cria algumas situações embaraçosas.

Ainda agora, lá no Paraguai, como ocorreu neste fim de semana, proposta do presidente Lugo foi aprovada pelo Congresso Nacional. As duas casas concederam poderes plenos ao Executivo para combater a guerrilha.

O debate é intenso. Os grupos, armados, presentes nos departamentos do Alto Paraná, Concepcion, Presidente Hayes, San Pedro, são guerrilheiros socialistas? Ou elementos oriundos de movimentos sociais?

Mais ainda. Meros delinqüentes municiados por plantadores de maconha?

São versões para um mesmo tema: a presença da violência em vários departamentos da República. Lugo, o presidente eleito a partir de San Pedro, está no centro da crise.

Solicitou estado de exceção para áreas onde nasceu politicamente e exerceu grande influência, hoje enfraquecida. A oposição ao governo logo concedeu a medida extraordinária.

É forma de fragilizar, ainda mais, a popularidade decadente do presidente constitucional. A situação mostra-se preocupante. Permite uma série de reflexões sobre o futuro político do Paraguai e de seus vizinhos.

Qualquer que seja a natureza do EPP – Exército do Povo Paraguaio – as conseqüências são inevitáveis. A sua presença e o combate que, durante trinta dias, sofrerá por parte do Exercito, levará a instabilidade.

Esta instabilidade, em ondas, atingirá o vizinho Brasil e o fará em período eleitoral, quando todas as sensibilidades se encontram ampliadas. Muitos serão os temas decorrentes do ato do Congresso paraguaio.

É só esperar para ver.

*El país de La sopa dura – Helio Vera – Editorial Servilibro – Assunción – 2010

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