VEJA CONSUMIDOR: UM JUDICIÁRIO QUE ENCANTA!


Em recente decisão do Colégio Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Estado de São Paulo, proferida em ação movidacontra o site “Americanas.com”, na qual mais uma vez tivemos a oportunidade de defender o consumidor, e ver reconhecido pelo Poder Judiciário o nosso pedido na íntegra, esse – em geral marcado por uma imagem carrancuda e autoritária – encantou-nos. Ao invés das letras frias dos clássicos textos de lei, reverenciou a pessoa.

Registrou de modo enfático suas angústias. Afagou seus sentimentos. Honrou suas crenças e riu de quem ri de nós. Oportuna, pois, a transcrição e a divulgação de trechos deste decisório, que apresenta um Judiciário sensível aos problemas do cenário do consumo, à fragilidade do indivíduo consumidor, atento à impositiva necessidade de assegurar-lhe proteção. Seguem trechos da decisão:

Recurso n.17.010 – Pinheiros – Acórdão – Voto n.1969 – JEC Pinheiros Processo 948/07.

“(…) O estorno dos valores só se deu depois do recorrente pagar todas as parcelas debitadas na sua fatura(…)o que ocorreu mesmo ele não tendo recebido o produto. A circunstância implica a obrigação da devolução dobrada do indevidamente recebido(…).

O reconhecimento da existência do dano moral (…) foi correto. Não é difícil imaginar a decepção de uma criança que espera ganhar um presente e que não o recebe no Natal. A situação, aliás, foi muito bem descrita em uma antiga marchinha (…): Eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel! Com certeza já morreu, ou então, felicidade é brinquedo que não tem! Deve ser esta a sensação da criança não contemplada no tão ansiado dia. E tal sensação acaba por contaminar os adultos. Ou seja, a omissão (…) trouxe tristeza à família do recorrido no dia de Natal. Tal tristeza peculiar ofende a paz de espírito (…) e se caracteriza como dano moral, passível de indenização.

(…) Não danos de grande porte, mas daqueles que vão corroendo por dentro os consumidores (…) e que se somam ao longo do tempo para depois, de súbito, desembocarem em uma síncope nervosa ou em um ataque cardíaco fulminante e inexplicável. É adequado aqui lembrar o grande Chico Buarque: pode ser a gota d´água.

É fato que nos dias presentes há uma banalização dos danos morais. De outro lado, é bom que não se esqueça também que há uma tendência das grandes corporações colocarem na vala comum do mero aborrecimento banal toda e qualquer conduta da parte delas com relação aos seus clientes – patrimônio maior das empresas, mas tão maltratado por elas.

O caso do recorrido não foi aborrecimento banal. Ingressou no campo do dano moral pela vulneração dos direitos dele como consumidor que causou uma enorme decepção, de não ver entregue o tão ansiado presente adquirido para que o filho pudesse ser presenteado em data tão especial como a do dia de Natal. Tal espécie de sensação é passível de reparação(…)recompensando a frustração impingida“ (grifo nosso).

Parabéns Senhores Juízes Antonio Mário de Castro Figliolia, Alcides de Leopoldo e Silva Junior e Jorge Tosta pela brilhante decisão. Esse é o Judiciário que encanta!

Carlos Eduardo Herman Salem Caggiano é advogado especializado em Direito do Consumidor, já tendo exercido inúmeros cargos na Fundação Procon-SP.

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