Revista CEPES
Independência dos povos sul americanos


…los aspectos más revolucionarios de la Constitución de 1812 fue
dotar a las Cortes de un gran poder e incorporar la participación
política de las masas.*

Quando se estuda a independência dos países da América do Sul, alguns elementos
devem merecer prévio registro e reflexão.
Os acontecimentos políticos americanos, no decorrer do Século XIX, contam com
características nativas e outras importadas de realidades sociais externas.
Certamente, motivos econômicos, como o excesso de rigor do fisco das metrópoles,
conduziram a uma natural revolta dos americanos do sul.
A par deste fator, de natureza fundamental, sentimento nativista surgia entre os filhos
dos europeus, aqui nascidos.
No entanto, elementos estranhos à realidade social do continente mostraram-se
fundamentais na geração do sentimento independentista em todas as sociedades sul
americanas.
Seguramente, o estudioso deve se debruçar sobre três acontecimentos alienígenas para
entender os fatos ligados aos vários processos de independência verificados no já citado
Século XIX, a saber:

• A Guerra da Independência desenvolvida nos Estados Unidos contra os ingleses.
A luta dos americanos do norte estimulou outros povos a reagir contra as metrópoles.
Além deste fator, a Guerra da Independência, nos Estados Unidos, apresentou aspectos
intelectuais de grande relevância.
Os atos antecedentes a sua elaboração – fala-se da Constituição 1787 – revelaram
figuras intelectuais de grande relevância.
Os autores do Federalista, livro composto pelos artigos de Madison, James e Hamilton,
mereceram repercussão entre os povos do sul.
A Constituição norte americana, elaborada por cinquenta e cinco delegados, durante
quatro meses, serviu de paradigma a todos os lideres dos processos de independência.
Bom recordar:
Os delegados presentes em Filadélfia eram de raiz puritana.

Conheciam, pela origem de cada um, o Direito Inglês e a evolução das instituições
políticas na Inglaterra.
Mas, apesar da importância dos fatos desenrolados nos Estados Unidos, os fatores
determinantes dos vários processos libertários sul americanos se encontram na Europa e,
particularmente, na Península Ibérica.

• Como é sabido, a partir de 1801, tropas napoleônicas invadem o espaço
peninsular.
Antes espanhóis e franceses colocam-se contra Portugal.
Posteriormente, os espanhóis rompem com a França e se colocam em posição comum
com Portugal face aos franceses.
É a chamada Guerra Peninsular.
Esta, na Segunda Invasão francesa, leva D. João VI a se deslocar para o Brasil.
Acontecimento curioso que deslocou Portugal à posição de dependente do Brasil.
A sede do Reino foi transferida para o Rio de Janeiro em 1808.
A invasão napoleônica, no espaço espanhol, levou aos liberais da Espanha a se
refugiarem em Cádiz, cidade portuária com face para o Atlântico.
Elaboraram os espanhóis, com alguns delegados hispano americanos, na mencionada
Cádiz, a Constituição Espanhola de 1812.
Este documento, somado à prisão de Fernando VII, rei da Espanha, em Baiona, na
França, levou os sul americanos a grande elucubrações intelectuais.
A Constituição de Cádiz trazia poderosa novidade política.
A ideia das Juntas, colegiados cujos titulares eram escolhidos por voto.
Além desta figura nova, surgiram elucubrações mais
profundas.
Se o rei da Espanha – Fernando VII – encontrava-se preso, estava afastado o princípio
da soberania divina própria dos soberanos.
Ausente a soberania divina originária do rei, esta seria substituída pela soberania
popular.
Aqui, entra Rousseau, muito apreciado entre os latino americanos na época.
Além do pensamento do genebrino, ensinamentos da Revolução Francesa chegaram à
América, apesar dos esforços em contrário da Inquisição, com seus tribunais instalados
em Lima e Cartagena.
Volta-se às Juntas.

Pode-se imaginar os debates que ocorreram em todas as cidades então existentes pela
América meridional, inclusive no Brasil, onde a Constituição de Cádiz teve sua parte
eleitoral adotada por D. João VI.
Deve-se creditar a esta vertente, ou seja, a implantação das Juntas, a criação de fermento
libertário.
Este fermento foi o motor das guerras de independência.
Concomitantemente, com os debates desenvolvidos no interior das Juntas, outros
ocorriam em instituição avoenga no Direito Público espanhol.
Fala-se dos Cabildos, ou seja, as corporações que regiam os municípios.
A primeira manifestação libertária, por exemplo na Argentina, deu-se no Cabildo de
Buenos Aires.
A este ato dá-se o nome de Revolução de Maio – 1810 – na História da Argentina.
Claro que os Libertadores – Bolívar, San Martin, Lavalleja, Sucre, Miranda e outros –
tiveram grande importância nas várias independências.
Mas, todos eles, sem exceção, conheciam os autores básicos franceses e ingleses de
textos políticos da época e de seus antecedentes.
Um ponto, porém, deve ser gizado com firmeza:
a Constituição de Cádiz merece posição de proeminência quando se estuda o processo
de liberação dos povos sul americanos.
Constituição, elaborada em condições adversas, em razão da invasão francesa, foi
elemento essencial para as lideranças deste Continente buscarem à soberania para seus
povos.
Paradoxos do constitucionalismo.
Busca-se um objetivo e se obtém outro inimaginável pelos constituintes.

Referências:
* Rodriguez O., Jaime E. – La independência de la América española – Fondo de
Cultura Economico – Mexico – 2010.
Padover, Saul K. – A Constituição Viva dos Estados Unidos – Ibrasa – 2º edição –São
Paulo – 1987.
Vicente, Antônio Pedro – Guerra Peninsular – QN – Edições e Conteúdos – Lisboa –
2006