RÉQUIEM PARA A JUSTIÇA


Questi tragici giorni che viviamo … è sicura garanzia de rinascita morale.

(Piero Calamandrei – Itália – 1943)

 

 

A crise vivenciada pelos brasileiros contém contornos de imensa gravidade.

Espalha-se pelos mais diversos segmentos da sociedade e, a partir de determinados episódios, a torna frágil, por impedir a sadia convivência.

Já não se fala dos horrores praticados nas prisões por alguns internos ou pelo próprio Estado.

Estes horrores são de tal gravidade que os meios de comunicação tiveram de apontá-los e comentá-los.

Apresentaram imagens e textos exibindo a falência das atividades estatais nos espaços prisionais.

A fragilização da imagem do Estado nacional, porém, não se limita a aspectos de pronto identificáveis, como a situação deplorável dos presídios.

Este movimento de depreciação da figura do Estado avança para todos os cenários.

Lutou-se – e muito – para se alcançar a plenitude do Estado de Direito, enfim a legalidade.

Ou seja, o pressuposto de que toda a cidadania – sem exceções – é regida pela lei e esta é igual para todos.

Quando se fere esta primordial condição,  viola-se toda uma admirável construção doutrinária.

Pior.

Fere-se a possibilidade de se conviver em segurança jurídica.

É o que acontece no Brasil.

As autoridades constituídas diariamente ferem a legalidade.

Afastam a prevalência da lei.

Abandone-se os dramáticos acontecimentos verificados nos presídios do Amazonas, Roraima e Rio Grande do Norte.

Deixe-se, por um momento, o horror das masmorras.

Gire-se os olhares para o interior dos palácios.

Neles, entre tapetes e obras de arte, sem qualquer pudor, a legalidade é publicamente violada.

Oficiais de Justiça procuram altas autoridades.

Apesar de sombras altamente significativas, elas se dizem ausentes.

Esquivam-se de cumprir ordens judiciais.

Estas poderiam oferecer aplicação equivocada ou má interpretação da lei.

Não importa.

Eram emanações da jurisdição, atividade essencial do Estado de Direito.

Daí se tornarem lamentáveis as fugas aos oficiais de Justiça por parte de figuras significativas da área pública.

Elas indicam  – estas fugas – explicitamente o nível de fragilidade em que se encontram as instituições.

Acham-se desautorizadas pelos detentores da obrigação de fazer cumprir as normas legais.

É a anomia social expressa de maneira preocupante.

Não se pode viver longe da legalidade.

Esta só prevalece quando a lei é respeitada e cumprida.

A marginalização da lei e o achincalhamento do Judiciário origina-se, pois, em grande espaço, pela atuação de autoridades do mais alto grau.

É lamentável.

Sem exemplo dos superiores, o que resta à cidadania?

Cada um responderá como lhe aprouver.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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