REAGIR POR VERGONHA


Aproxima-se o fim do ano. Muitas são as perspectivas para a análise retrospectiva do período. O avanço das pessoas economicamente deprimidas para patamares superiores. Um motivo de alegria.

A passagem pela grande crise financeira sem perdas maiores, salvo da dignidade daqueles empresários que se aproveitaram do momento para, ainda uma vez, avançarem sobre o erário público.

Agiram de maneira irresponsável. Utilizaram a matemática financeira – como hábeis mágicos – para gerar riqueza inexistente. Foram muitos. Todos conhecidos e comensais nas mesas de todos os governos. Grandes obras e maior presença de conhecidas personalidades – políticas e privadas – capazes de transitar por todos os governos, independente de cor ideológica ou posição filosófica.

A incoerência atingiu níveis inconcebíveis. Falou-se e omitiu-se com a leveza das folhas ao vento. Homens vividos, em anos, lançaram-se em esdrúxulas campanhas.

Religiosos tornaram-se agentes de vícios condenados por suas confissões. Já não se respeitam princípios, ainda porque os antigos valores se desfizeram e outros não foram criados.

Restou o consumismo. Compra-se tudo. O necessário e o supérfluo. Consome-se mais que o necessário. Há uma volúpia em volta do ter. Nada aponta para o ser digno e laborioso.

O trabalho tornou-se acessório. Ganhar fácil é o que importa. Quanto mais se sobe na escala econômica, pior o cenário. Dentro deste quadro devastador, a violência invade as cidades e suas ruas.

Uma reação torna-se necessária. Não dá para continuar. Um surto de dignidade se impõe. A afirmação aponta para uma carga de ingenuidade. Não é bem assim.

As sociedades, quando se encontram a caminho da decadência acelerada, reagem. Surgem novas formas de viver. Optam por novas figuras políticas. Buscam valores aparentemente superados.

A vergonha – apesar das aparências em contrário – ainda permanece na consciência das pessoas. A dignidade não restou castrada pelos ladrões de dinheiros públicos.

Muito menos por falsos heróis, quer de direita ou de esquerda. Já se reconhece quem agiu com coragem e desprendimento e aqueles que, em anos passados, mostraram-se agentes do caos.

Estes – de direita ou de esquerda – ainda operam a política nacional. Levam o barco sem qualquer sentimento democrático. Falta-lhes afinidade e afetividade com as práticas democráticas.

Estas práticas são exaustivas. Exigem persistência. É caminhada com altos e baixos. Não há líder permanente e nem exercício do poder por todo o tempo.

Raros são os novos políticos no panorama brasileiro. A engrenagem partidária bloqueia o nascimento de novas lideranças. Permanecem os de sempre. Aos poucos, fenecem as oportunidades.

Resta uma pasmaceira indolente e sem qualquer criatividade. Ai os aproveitadores tomam de assalto as instâncias do Poder e passam a agir sorrateiramente ou desinibidos como assaltantes de estradas.

Resta a utopia. A crença imorredoura no aperfeiçoamento das pessoas e das sociedades. Apesar de todos os acontecimentos, avançou-se em conquistas sociais.

A política, como arte de dirigir comunidades, é a questão. Ainda não se aperfeiçoou nestes tristes trópicos. O mandonismo permanece. A vivacidade supera os bons comportamentos.

Tudo poderá mudar se todos passarem a exigir mais transparência e souberam escolher seus dirigentes. Não se vota de favor ou por mera simpatia.

O voto deve ser instrumentalizado para cortar cabeças e incentivar vocações. Não é mero apertar de botões. É muito mais. Trata-se de exteriorização de vontade intima.

O ano de 2010 com suas eleições gerais – depois de duas décadas de plenas práticas democráticas – poderá impelir a sociedade a optar por novos caminhos e afastar os descalabros até aqui vivenciados.

Uma sociedade não pode manter-se para sempre moralmente enferma. Precisa reagir. Deverá fazê-lo em outubro. Pelo voto.

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