PERIGO À VISTA


Perigo à vista. A América Latina possui um passado de golpes de Estado apreciável. Todos os tipos de ação já foram realizados para a manutenção ou obtenção do Poder.
Quarteladas. Acertos legislativos. Mudanças de sistemas políticos. Enfim as mais incríveis arrumações se concretizaram com o objetivo de manter ou obter o almejado Poder.
Parecia que, com a onda de democratização dos anos 80, a prática tinha se esgotado. Mero equívoco. Os valores culturais das sociedades são difíceis de serem alterados.
Aqui, no Brasil, durante os períodos democráticos, anteriores a 1964, um princípio teve vigência na vida republicana. A vedação da reeleição. Os constituintes de 1891 foram taxativos.
Apontaram, em seus trabalhos doutrinários, que admitir um presidente candidato é expor o eleitorado à pressão, corrupção e fraude na mais larga escala.
Apesar da advertência dos primeiros constituintes, preservada quando da feitura da Constituição de 1988, a Emenda Constitucional n. 16, de 5 de junho de 1997, rompeu com a boa prática da vedação de reeleição.
De maneira pouco clara e até hoje inexplicável, apesar dos protestos da imprensa na época, a reeleição foi implantada no País rompendo uma sadia tradição.
Felizmente, no último mandato presidencial – do presidente Lula – apesar dos esforços dos áulicos, a reeleição indefinida não foi adiante e nem mesmo incentivada pelo presidente.
Este bom exemplo, contudo, não mereceu atenção da nossa América Latina. Ainda agora, na nossa vizinha Argentina, grupos políticos correm as províncias em pregação pró-reeleição sem limites.
É uma pena. A Argentina é exemplo para muitos povos latino-americanos e, particularmente, para seus dirigentes. O país sofreu na fase colonial um grave surto caudilhesco.
Este se estendeu por muitas outras colônias espanholas e atingiu, inclusive, o Rio Grande do Sul, aqui no Brasil. Os conflitos políticos transformavam-se em sangrentos duelos armados.
Assim, pois, como aconteceu no passado, tudo o que ocorre na Argentina tem repercussão nos demais povos sul-americanos. Ora, a busca da reeleição infinita é uma forma de caudilhismo.
Afasta a boa e sadia alternância. É necessário oxigenar os quadros políticos alterando-os de tempos em tempos. A manutenção dos mesmos figurantes indefinitivamente é desserviço à democracia.
Os partidos têm a obrigação cívica de oferecer sempre novas personalidades para substituir as antigas na concretização de políticas públicas. Nada mais enfadonho para o eleitor que ver sempre as mesmas caras.
A presente pretensão dos políticos argentinos é descabida. Cria uma situação desconfortável para o jogo político aberto e arejado. Mostra uma face amarga do egoísmo personalístico.
Ontem o Brasil com a adoção da reeleição e agora a Argentina com a procura da reeleição sem limites apontam para a fragilidade das instituições neste Continente.
Não se procuram novos políticos. Contentamo-nos com os de sempre. Os de sempre, por sua vez, não se apercebem que o tempo passa e o peso dos anos é intransponível.
Espera-se que a vontade dos correligionários da presidente da Argentina fracasse. Será melhor para o futuro democrático desta sofrida América Latina.
O mau exemplo possui forte capacidade de propagação. É preciso evitar que isto aconteça.
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