O CAOS PARTIDÁRIO


Não há emoção. As pessoas discutem – ou apenas falam sobre eleições – sem qualquer traço de plena adesão. Procuram um candidato. Afirmam que irão votar nele. E nada mais. Os vividos em anos conheceram muitos pleitos. Havia clima emotivo. A adoção de uma candidatura tornava o eleitor um apaixonado. Ele batia-se pelo escolhido sem limites.

Os mais velhos podem recordar a adesão às candidaturas de Jânio Quadros ou de Adhemar de Barros, aqui em São Paulo. Era assunto sério. Causava grandes conflitos. Conta-se que, em outros Estados, uma família com membros integrantes do PSD – Partido Social Democráticos – não permitia casamentos com militantes da UDN – União Democrática Nacional.

Eram inimigos e inimigos combatem seus adversários. Não podem oferecer gestos de afabilidade ou muito menos de amor àqueles que se encontram do outro lado do conflito cívico. Exageros de uma sociedade com traços patriarcais e originária do cenário rural, onde os “chefes” políticos tinham domínio sobre seu clã e respectivos subalternos.

Claro que eram tempos nada democráticos e a igualdade passava à distância dos costumes sociais. Votava-se no candidato do proprietário de terras. Era um dever de lealdade. Ou o medo de ser perseguido.

A literatura brasileira revela imensa variedade de estudos a respeito deste longo ciclo de nossa vida política. Não podia permanecer. Violava os mais rudimentares princípios atinentes à dignidade humana.

É verdade. Mas indicava, concomitantemente, que a pessoa pertencia a um grupo social e este lhe dava guarida e o protegia contra os azares da vida.

Os tempos passaram. As grandes mudanças na estrutura social alteraram os comportamentos. Já não existem as “colônias” nas fazendas. O trabalhador agrícola instalou-se nas cidades.

A maioria dos brasileiros migrou para as metrópoles litorâneas, nas quais o sentido de comunidade se fragilizou. As pessoas passaram a viver isoladamente, ainda que no interior de grandes coletividades.

Os traços de solidariedade enfraqueceram. Restaram os egoísmos e os interesses, por mais singelos que sejam estes últimos. Tudo isto aconteceu nos últimos cinqüenta anos. Até a formação de um novo conjunto de laços entre as pessoas ainda longo tempo ainda decorrerá. Este panorama social se reflete nas campanhas eleitorais de hoje. A par deste acontecimento social – as migrações – encontra-se a decepção existente, na consciência de cada eleitor, em relação aos partidos políticos. Alguns se elevaram a altura de guardiões da moralidade.

Foi um fiasco. Os atos de corrupção flagelaram seus quadros e conseqüentemente suas imagens. Aqui e ali se recompuseram. Mas, a marca da traição permanece no inconsciente coletivo.

Vota-se, mas de maneira desconfiada. Ainda porque os partidos, por meio de seus dirigentes, construíram coligações esdrúxulas e incompatíveis com seus programas e atuações.

Valem minutos de horário de rádio e televisão. Pouco importa o passado dos partidos e de seus candidatos. O inimigo de ontem é o aliado incondicional de hoje. Isto cria um desânimo no eleitorado. Particularmente, em seus segmentos de eleitores com mais idade. Lembram-se de antigas campanhas e recordam-se das agressões de ontem e os afagos de agora.

É uma visão surrealista. Até no País de Macunaíma, a falta de caráter agride. Com tudo isto, não se formam quadros políticos qualificados.

Ao contrário, candidatos se mostram despreparados e incapazes de representar com dignidade a sociedade. As peneiras partidárias funcionam inversamente à qualidade. Quanto pior, melhor. Quando os resultados forem proclamados, caberá à sociedade civil propor, por meio de suas organizações, uma reforma partidária. Um pouco mais de consistência das agremiações poderá levar a uma definição filosófica mais nítida.

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