MAQUIAVEL, HOJE


Passa despercebida. Uma data centenária comemora-se no ano das grandes manifestações populares por todo o País. Há quinhentos anos uma obra marcante, no cenário político, surgia.

A maioria dos estudiosos aponta para o ano de 1513 como indicativo do término da obra mais conhecida de Maquiavel: O Príncipe. Este volume alterou a maneira de se conceber a política.

Antes do seu aparecimento os princípios teocráticos dominavam. Apresentava-se, por todo a Europa, uma forte vinculação entre a religião e a política.

Com o surgimento de O Príncipe alteraram-se as maneiras de atuação dos políticos. Surgia o Estado independente da pessoa do governante de ocasião.

Os assuntos de Estado foram transportados para esfera própria. Os erros e ações administrativas passaram a ser autônomas. Responsabilidade de seus autores.

Aumentaram, assim, as obrigações dos governantes. Estes passaram a ser os responsáveis por seus atos. Á não se impunha a intervenção do divino nas coisas humanas.

Ganhava a pessoa autonomia. Vivia-se a Renascença italiana, um dos períodos mais ricos no campo do conhecimento. Cada um tornava-se titular de seu destino.

Mais ainda. Elaborava diretrizes de conformidade com seu pensamento e de acordo com suas convicções. Maquiavel escreveu seu pequeno tratado político em período de ostracismo.

Homem culto e político atuante sofreu perseguições e afastamentos drásticos da vida dos negócios da coletividade. Não se abateu. Ao invés de se omitir, elaborou obra que alteraria os rumos da política por todo o Ocidente.

Florença, a terra de Maquiavel, conheceu em seu período diversas manifestações populares a partir de uma figura carismática e de forte personalidade. Fala-se de Savonarola.

Líder popular, Savonarola conduziu as massas florentinas para momentos de exaltação. Era um reformista. Combateu tenazmente a corrupção dos costumes e do clero em particular.

Com a morte de Savonarola – na fogueira, como corriqueiro na época – assumiu o governo de Florença os Medici. A Lorenzo de Médici dedica o autor florentino a sua tão conhecida obra.

O Príncipe foi e continua a ser analisado por inúmeros ângulos. Religiosos o reprovaram. Céticos aplaudiram. Estudiosos proclamaram sua capacidade de ver a natureza humana – enquanto governante – sem falsas aparências.

Recorda-se Maquiavel – e o quinto centenário de O Príncipe – após os brasileiros conhecerem movimentos populares extremamente significativos. Ousados. Marcantes.

Agora – passada a euforia – é tempo de repor as instituições em seus devidos lugares. Maquiavel temia, sobretudo, a ausência de autoridade, ou mais claramente, a anomia social.

Ele sabia os riscos da ausência de normalidade nos assuntos da sociedade. Toda vez que a desordem ocupa o lugar das – e nas – instituições surge o risco do colapso.

Aqui reside o perigo. Encontra-se em curso uma busca da fragilização das instituições. Ao são apenas os “vândalos” nas ruas que enfraquecem a vida coletiva.

As autoridades , quando se agridem publicamente, sem motivação expressa, também agem como agentes da desordem e da falta de compostura. Inimigos da urbanidade.

Seria oportuno que, nos três cenários do Poder, os seus ocupantes se recordassem dos quinhentos anos do aparecimento de O Príncipe. Aprenderiam, com sua leitura, os riscos do exercício do poder sem limites.

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