LIÇÃO DRAMÁTICA


As múltiplas culturas sempre procuraram atingir o bom governo. Pensadores e filósofos. Santos e pecadores buscaram captar e oferecer os atributos de um governo respeitável.

Na antiguidade ou nos tempos modernos, muitos se debruçaram sobre a tarefa de recolher os elementos próprios de um governo capaz de servir às demandas da comunidade.

Alguns imaginaram governantes dispostos a ser santos. Outros reconheceram a fragilidade moral das pessoas. Todos, contudo, não se afastaram do objetivo: captar e registrar a essência do bom governo.

Em tempos atribulados, como os contemporâneos, muitas das lições clássicas se perderam. Os governantes encontram-se sem rumos. Parecem naus sem timoneiros.

A transparência – própria da contemporaneidade – ainda não foi inteiramente absorvida pelos políticos como fator essencial ao bom desenvolvimento dos negócios públicos.

Imaginam-se, membros do Executivo e do Legislativo, reis absolutistas capazes de realizar as mais inconcebíveis ações, sem qualquer censura. Violam a lei. Ferem os costumes. Agridem o patrimônio público. Enriquecem sem causa.

Pensam que tudo passará às trevas. Enganam-se. Nas democracias a publicidade é componente essencial da boa administração. Atos secretos e democracia não convivem.

Ainda mais. O caráter das personalidades públicas fica desnudo nos modernos instrumentos de divulgação. As fisionomias surgem por inteiro. As consciências emergem.

O rosto estampado na tela de uma televisão ou de um computador espelha todos os dados a serem analisados pela cidadania. O safado, debochado ou irresponsável é prontamente identificado.

Apesar destas evidências, personalidades públicas, aqui ou alhures, parecem não se preocupar. Agem como malfeitores no interior de uma noite escura. Não possuem limites para suas ações.

Avançam no patrimônio público. Mentem. Afirmam e retrocedem. A palavra proferida – por vontade própria – é em hora seguinte esquecida. Imaginam que a opinião pública é formada por tolos.

É triste assistir integrantes do Executivo e do Parlamento perderem a dignidade com a rapidez do vôo de um pássaro. Quando parecem grandes em suas atitudes, estão escondendo a verdade.

Informam por vontade própria e guiados por vontade alheia desmentem suas próprias afirmações. É melancólico o espetáculo. Deixa seqüelas. Ninguém se mantém confortável em quadro de instabilidade moral. De desconfiança.

Os últimos tempos só trouxeram decepções. Frustrações profundas. A tergiversação tornou-se hábito entre políticos. A mudança de opinião traço vexatório da ausência de valores.

Esquecem estes atores políticos que os eleitores se encontram alerta. Devem recordar ensinamento de Confúcio, quando apontou para valor fundamental no exercício da ação política. Valor impostergável.

O mestre do pensamento oriental expôs por meio de diálogo com seu discípulo Mêncio, que existe um bem insubstituível nas relações entre o governante e seu povo.

Não se deve avançar e, de pronto, registrar qual é este bem. É melhor recolhê-lo em sua própria versão histórica. Reproduzir o diálogo de Confúcio e Mêncio permite atingir o ápice da lição:

Uma vez um discípulo perguntou a Confúcio: Quais são os ingredientes para um bom governo? Ele respondeu: A comida, as armas e a confiança do povo no governante.

Mas, prosseguiu o discípulo: Se fostes constrangido a renunciar a um entre os três ingredientes, a qual renunciarias? Às armas. E se devesses eliminar a outro? Os alimentos, respondeu Confúcio.

Ora, sem os alimentos a gente morre! Exclamou o discípulo. Respondeu o mestre com segurança e firmeza:

A morte representa desde tempos imemoráveis o inevitável destino dos seres humanos, enquanto que um povo que não tem confiança nos seus governantes é verdadeiramente um povo perdido.

A que lembrança leva esta lição?

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