HOFBRAÜHAUS


O momento exigiria a análise específica dos resultados eleitorais. Há outros temas relevantes, contudo. Por exemplo, a ausência de transferência do eventual prestígio político de algumas personalidades a seus candidatos.

Muitas seriam as observações às opiniões e reflexões sobre o futuro da convivência partidária no País. Contudo, algo se tornou claro. É bom frisar, sem maiores divagações.

A consciência do eleitor quanto à necessidade de preservação da autonomia das unidades federadas. Os resultados eleitorais são nítida demonstração desta realidade.

No município, vota-se de acordo com os interesses locais. Opinião de fora não importa. Cada munícipe, na pequena comuna ou na grande cidade, conhece melhor as questões prioritárias.

Eleições transformaram-se em rotina. De dois em dois anos, o ritual democrático aperfeiçoa-se. Tudo corre com normalidade. Os raros incidentes, quando ocorrem, não possuem profundidade.

Em terras estrangeiras, sim, geram-se novidades inacreditáveis. A par da crise econômica, que aflige em ondas todas as sociedades, inclusive o propalado porto seguro tupiniquim, há outras novidades.

E como. As cortes judiciárias européias se encontram em atividade incessante. Parecem querer superar o nosso Supremo Tribunal Federal em novidades. Basta acompanhá-las.

É da Itália, todavia, que vem a decisão capaz de fazer História. Repercutirá por toda a parte. Certamente, junto aos países latinos americanos que conheceram regimes de exceção.

No ano de 1944, os habitantes de Civitella, Cornia e San Pancrazio foram alvos de extermínio em massa por tropas alemãs em represália à morte de quarenta e quatro nazistas.

Crianças, homens e mulheres, algumas antes violentadas, foram submetidos a fuzilamento sumário. O sargento Max Josef Milde comandou a operação de massacre. Foram duzentas e três pessoas exterminadas.

Milde foi condenado à prisão perpétua. Os familiares das vítimas do extermínio solicitaram à Justiça italiana reparação civil pela violência que sofreram seus parentes.

Até ai, nada de novo. A novidade é a presença do comandante da operação em litisconsórcio com a República Federal da Alemanha como réus da ação. O governo alemão contestou.

Defendeu-se. Baseou-se em tratado de 1947 e acordos firmados em 1961. Em vão. Em sentença inédita, a Corte de Cassação italiana condenou cumulativamente o executor das mortes e o Estado alemão.

A execução da decisão apresenta-se como um episódio judiciário inédito. A Justiça de um Estado avança além dos limites de sua soberania. Condena outro Estado soberano a indenizar vítimas de suas tropas.

Presente ainda o tema prescrição. Surge o princípio clássico. Os crimes contra os direitos humanos são imprescritíveis. Sob este ângulo a decisão italiana necessita ser melhor examinada em seu conteúdo.

A mera notícia da decisão, ora presente na imprensa, leva a sua inevitável repercussão no cenário jurídico de todas as sociedades. Interessante ainda é acompanhar seus efeitos no sofisticado mundo jurídico alemão.

Volta-se com esta decisão aos tumultuados dias dos anos 20, quando um medíocre pintor, em cervejaria de Munich, incendiava o ambiente com seus discursos inflamados.

Hitler, um fundamentalista, expunha o seu programa de vinte e cinco pontos. Estes gerados pela crise moral e econômica que atingia a Alemanha. Parecia impossível implantá-los.

Propunha a nacionalização das grandes empresas. Desejava Reforma Agrária. Pregava uma Reforma da Educação. Buscava a formação de forte governo central. Defendia a criação de conselhos de categorias econômicas.

Ninguém – a princípio – levou a sério as propostas do aventureiro. Elas, todavia, se concretizaram. Originaram o Partido dos Trabalhadores Nacional Socialista Alemão, denominação permitiu a sigla nazismo.

Uma cervejaria – Hofbraühauss -, um fundamentalista e uma crise econômica refletem seus efeitos por gerações. O presente efeito: a decisão da Justiça de um Estado incidindo sobre outro Estado soberano.

print