ELEIÇÕES 2016 – O CANDIDATO NOS BASTIDORES. COMO O ELEITOR IRÁ CONHECE-LO?


ELEIÇÕES  2016

O candidato nos bastidores. Como o eleitor irá conhece-lo?

E a garantia do amplo leque de opções que deve ser oferecida ao eleitor em eleições democráticas? Eleições

E a liberdade que deve ser assegurada? E a isonomia?  São princípios estruturantes do ius sufragii.

 

Bem, a campanha político-eleitoral/2016 acabou de ser inaugurada no último dia 16 de agosto e, desde logo, vão emergindo as inquietações. Próprias aliás de uma mini-campanha, um percurso de 45 dias em que, a cada dia, o observador se surpreende com o tratamento da lei, que coloca o candidato em uma posição de puro acanhamento. Silencioso, envergonhado e, mais que isto, nos bastidores da cena eleitoral.

Necessário observar, porém, o campo privilegiado em que se está: o direito de sufrágio, erigido a um dos mais eminentes direitos, diretamente relacionado ao homem político, porquanto lhe propicia, quer ativa, quer passivamente, a participação no polo epicêntrico das decisões políticas. Trata-se do direito de participação política, exercido pela cidadania no momento eleitoral que corresponde ao espaço de seleção dos governantes/representantes pelo corpo eleitoral, os representados. E mais que isto, a mecânica eleitoral foi se firmando na paisagem política como única a se acomodar à engrenagem funcional das democracias.

É verdade que o processo eleitoral não se revela exclusividade das democracias, sendo utilizado, com características e tonalidades diversas, até mesmo sob regimes autoritários e totalitários. Mas, tão somente nos panoramas democráticos as eleições legitimam o poder.

Assim é que o processo eleitoral democrático assume conotações próprias: deve se apresentar amplamente competitivo, afiançando a participação na disputa pelo poder aos mais diferentes setores da comunidade social, e timbrado pela garantia de liberdade – liberdade de voto, em relação ao corpo eleitoral, liberdade de candidatura, no exercício do sufrágio passivo, liberdade do discurso, de captação de simpatizantes e de adeptos para a respectiva campanha, liberdade de reunião, de associação – enfim a liberdade deve nortear, como princípio condutor o exercício do direito de sufrágio nos seus dois polos: ativo e passivo.

A concretização do princípio democrático, de fato, implica na instalação de um clima de beligerância entre as forças políticas (partidos e coligações) que batalham para alcançar o poder; mas, deve se estabelecer um sentimento de empatia e convergência entre os atores deste processo político – de um lado o corpo eleitoral, os representados e, de outro, os candidatos, futuros governantes/representantes. Para tanto, alinhada à liberdade e à elevada competitividade deste processo de seleção de governantes, a exigência de equilíbrio. Dai a interveniência do legislador, no sentido de assegurar equilíbrio à disputa.

Destarte, o quadro normativo de regência dos processos eleitorais tem por tarefa resguardar o equilíbrio, em atendimento e observância da isonomia, pilar das práticas democráticas. As medidas idealizadas, contudo, não poderão se revestir de tons proibitivos a ponto de nulificar os princípios de liberdade e competitividade. Se ao corpo eleitoral devem ser garantidas largas possibilidades de escolha, um leque amplo de opções, aos candidatos deve ser preservada a mais expandida via de diálogo com o corpo eleitoral,  reais e efetivas medidas de divulgação de propostas em torno de programa de governo e das políticas públicas que pretende implementar. Vedar esta possibilidade concreta de interação entre corpo eleitoral e candidaturas significa obstruir o pleno exercício da cidadania e subverter a ordem e o regular desenvolvimento do processo eleitoral nas democracias.

À luz desses apontamentos, pois, curiosa e inibidora a norma reguladora dos debates na rádio e TV, em especial diante da alteração introduzida pela minirreforma de 2015 (Lei n. 13.165). Ora debates na rádio e TV configuram espaço dos mais qualificados para que os candidatos – principalmente a cargos executivos – se apresentem ao corpo eleitoral. Constituem um momento único para que o eleitor possa entrar em contato com o quadro de candidatos e apreciar o desempenho de cada um deles. A exclusão de candidatos deste cenário de exposição ao corpo eleitoral investe diretamente contra o exercício da cidadania, afigurando-se fator redutor tanto em relação à liberdade de escolha do corpo eleitoral quanto em relação à liberdade de divulgação das ideias políticas por parte das candidaturas.

Manifesta a inconstitucionalidade, pois, do art. 46, da Lei 9.504/97, com a redação que lhe foi dada pela minirreforma. Enquanto, originariamente, garantia a presença nos debates de todos os candidatos – a cargos executivos – sustentados por partidos e coligações com representação na Câmara dos Deputados, facultando-a aos demais (sem bancada/representação), nos novos moldes, o texto acabou por assegurar a presença nos debates, tão só, às candidaturas apresentadas por partidos que detivessem representação superior a 9 deputados na Câmara de Deputados, restando facultada a presença dos demais (ainda que seus respectivos partidos tivessem bancada de representantes na Câmara, porém inferior a 9 deputados). Isto – ou seja a viabilidade de comparecimento facultativo ao debate – somente na hipótese de haver concordância por parte dos candidatos cuja presença fora garantida. É que o § 4o., do aludido art. 46, preconiza a celebração de um acordo entre os partidos (e seus candidatos) com presença afiançada e a emissora interessada em promover o debate.

Ora, a expectativa se oferece clara: os candidatos de presença assegurada – por meio do acordo previsto no § 4o., do aludido art. 46  (acima mencionado) – não autorizam a participação dos candidatos cuja comparecimento é facultativo. E nem teria motivo, neste cenário de competição pelo poder que o momento eleitoral revela. Mister advertir, contudo, que ao legislador compete manter o equilíbrio entre as forças políticas. Inclusive, cometendo às minorias instrumentos de participação política. Trata-se do princípio da igualdade em ação e este cânone maior deve comandar – em territórios democráticos – a atuação do legislador na confecção da lei.

Há uma tendência, albergada por parte da jurisprudência, registrando que o tempo de exposição dos candidatos  –  tempo de antena –  deve ser proporcional à densidade representativa de cada uma das agremiações partidárias, porquanto cada candidatura tem o seu espectro de simpatizantes e eleitores a atingir. A tese vem sendo aplicada na distribuição do tempo de propaganda gratuita na rádio e TV. Dai a vasta gama de coligações na busca de alargamento do tempo de exposição e permanência na tela.

O comparecimento aos debates programados pelas emissora, todavia, não se enquadra nesta hipótese.  O seu objetivo é o de aclarar o posicionamento do eleitor. A ele se dirige esta medida, mais do que ao próprio candidato que tem a opção do não comparecimento.  A vedação, introduzida pelo assinalado art. 46, da Lei eleitoral (Lei n. 9.504/97), importa em um verdadeiro corte cirúrgico no exercício da cidadania.

Por lesar os princípios condutores do processo eleitoral democrático merece ser ignorado e considerado de nenhum efeito, até em  homenagem ao eleitor.

São Paulo, 21 de agosto de 2016

print