ELEIÇÕES 2014


Uma Nova Aventura Eleitoral.

 

A expropriação de competência do Ministério Publico.

 

1.–    Ano eleitoral. Ano de emoções, arranjos políticos, realinhamento das forças partidárias que irão disputar os postos eletivos e novas investidas da Justiça Eleitoral no uso do clássico, tradicional e temido poder normativo que a Constituição de 1988 lhe atribuiu.

 

Pois bem, ha muito já foi remarcado o fato de que, no exercício da tarefa de editar normas disciplinadoras das eleições, a Justiça Eleitoral vem produzindo regras que transpõem – e muito – a competência que detém. Dois casos passaram a integrar este histórico elenco de avanços desnecessários e manifestamente ofensivos à letra da Constituição. Trata-se das conhecidas Resoluções de n. 21.702, de 2 de abril de 2004, que reduziu o numero de vereadores, impondo a edição de uma Emenda Constitucional para o reparo do corte cirúrgico efetuado, e da Resolução n. 20.993, de 26 de fevereiro de 2002, documento que passou a ser associado ao fenômeno da verticalização e que, a seu turno, exigiu emenda à Constituição para assegurar a liberdade e a autonomia dos partidos políticos de deliberarem sobre coligações.

 

2.–    Por mais uma vez, neste pleito de 2014, a cidadania e, principalmente, os atores do cenário da competição eleitoral são surpreendidos com a edição de dispositivos extravagantes. Impacta a Resolução TSE n. 23.396, 17 de dezembro de 2013, ou seja, baixada no fechar das cortinas do exercício de 2013 e extrapolando o limite temporal, constitucional, de um ano, para a edição de normas que venham a regulamentar as eleições/2014 (art. 16, C. F.).  Desta feita, a Justiça Eleitoral assume o monopólio do inquérito penal eleitoral, alijando o Ministério Publico desta relevante tarefa.

 

3.–  Inconcebível e, no mínimo, curiosa a ação do TSE que, em território definido por uma ordem jurídica antagônica a monopólios, respaldada no princípio do pluralismo (C. F., art.   ), por intermédio de uma mera Resolução, ato normativo de segundo grau e que deve atender, respeitar e se sujeitar aos limites da Lei e da Constituição,  extermina o exercício da competência constitucional do Ministério Publico de instaurar inquéritos penais, inclusive de natureza eleitoral (C. F., inciso VIII, art. 129).

 

4.-  E mais, perquirindo os termos da indigitada Resolução, o leitor é informado acerca do seu fundamento: art. 23, inciso IX, do Código Eleitoral e art. 105, da Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei Eleitoral). Os dois dispositivos, porém, cuidam tão somente da atribuição do TSE de expedir regulamentos para as eleições e a Lei Eleitoral de 1997 fixa o prazo limite para tanto em 5 de março. Mas, o mencionado art. 105, da Lei n.  9.504/97, vai além.  Identifica e aponta textualmente os limites materiais para a atividade normativa do TSE, advertindo: “Ate o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral, atendendo ao caráter regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta Lei, poderá expedir todas as instruções necessárias para sua fiel execução, ….”- grifo nosso.

 

5.–  Indaga-se, uma vez mais, o que restou da garantia da segurança jurídica ante a marginalização do princípio da legalidade e a ignorância do período de carência de um ano preconizado pelo já referido artigo 16 da nossa Magna Lei de 1988.

 

A historia se repete. Antes as Resoluções de 2002 e de 2004. Hoje o expurgo, por via de Resolução, de atribuição constitucional do Ministério Publico.  Certo é que, poderiam argumentar os defensores da redação dada ao art. 8, da Resolução TSE n. 23.396, 17 de dezembro de 2013, com o fato de que a Constituição Federal, no inciso VIII, do seu art. 129, refere-se apenas à instauração do “inquérito penal”. Isto, todavia, reforça a tese da competência do nosso “parquet” de instaurar inquéritos penais eleitorais, como alias se encontrava reconhecido na Resolução anterior (de n. 23.222/2010).  Onde o constituinte não distingue e não limita, não poderá o legislador infraconstitucional fazê-lo. E esta é regra elementar de interpretação constitucional.

 

6.-  A Democracia, cabe recordar, é exigente e o é com os cidadãos, com os governantes e com as instituições. Requer condutas éticas. É intransigente no terreno da garantia da segurança jurídica e da confiança mútua (mutual trust) entre governo e governados. No entanto, configura o único modelo político apto a preservar a liberdade do ser humano convivendo na sociedade politicamente organizada, notadamente, no complexo e sofisticado panorama que o século XX desvendou e que este começo de novo século vem consolidando.

 

7.-   A Democracia  reclama o esforço de todos. Isto porque a todos beneficia.

 

 

São Paulo, 11 de janeiro de 2014.

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