CLIMA DE DECADÊNCIA


Há um sentimento de frustração espalhado pela sociedade. Especialmente na classe média. As pessoas constatam um esfacelamento dos valores mínimos de convivência.

A criminalidade invade as ruas e ingressa nos espaços públicos. Paga-se impostos e a contraprestação oferecida pelo Estado é mesquinha. Ou nenhuma.

Para onde se olha, se vê a inação das administrações públicas. A voracidade tributária, no entanto, é a cada dia mais pantragruélica. Um apetite fiscal sem horizonte.

Preocupa a situação. Autores clássicos, ao analisarem a decadência do Império Romano, apontam para vários fatores. O fim das crenças pagãs levou o desconforto à sociedade.

Pode ser. O surgimento de uma nova religião de concepção monoteísta não preencheu, desde logo, o universo dos deuses pagãos. Faltaram protetores para muitas atividades.

É tema a ser discutido. No entanto, dois outros fatores apresentam mais objetividade para se captar o fim da notável obra política em que se constitui a civilização romana.

O crescimento inusitado da burocracia e o aumento dos arrecadadores de impostos. Estes, além de numerosos, tornaram-se vorazes no recolhimento de tributos.

A imensidão da malha burocrática e a excessiva cobrança de impostos conduziram a inevitável corrupção. Esta, por seu turno, levou à fragilidade do aparelho governamental.

Já não se produziam guerreiros. Forjavam-se corruptos na busca de seus próprios interesses individuais. O espaço público foi substituído pelos egoísmos particulares.

Roma – com sua grandeza imperial e republicana – ruiu e deu espaço ao esfacelamento de seu espaço territorial e ao fim de suas conquistas militares e econômicas.

Pode parecer exagero. Talvez é. Existe, no entanto, no cenário atual de muitas cidades brasileiras, um clima de acentuada decadência. Romperam-se os liames de uma religião hegemônica.

Multiplicaram-se as crenças religiosas. Estas, nem sempre, preenchem os vazios deixados pelos intercessores antes existentes. Os inúmeros santos da devoção de nossos antepassados.

Este é um aspecto. Os outros dois se apresentam mais de imediato no cotidiano das pessoas. A corrupção envolve muito da máquina governamental.

Diariamente – todos os dias, portanto – o noticiário se atém a único tema. Mais um corrupto foi pego com a boca na botija. Há ladrões de todos os tamanhos.

Desde o grande empresário corruptor até o pequeno estafeta corrompido pelo prazer doentio de violar a consciência alheia. Nada é sólido. Tudo é assustadoramente mutável.

Esta fragilidade moral, antes de natureza singular, transferiu-se para o coletivo. As nossas cidades estão se desfazendo. Os velhos centros históricos – marcos de identidade coletiva – deterioram-se.

Nenhuma ação das autoridades. Tudo acontece como se fosse estranho às obrigações dos administradores públicos. Os edifícios, marcos de épocas da história, não merecem cuidados.

As pessoas são lançadas às ruas sem qualquer pudor. Morrer, nas calçadas e viadutos, das cidades tornou-se normal. Nenhuma censura. Sequer um grito de alerta.

O mais perverso do capitalismo venceu nestes tristes trópicos. A vida nada vale. Os monumentos históricos pouco importam. O passado, com seus vultos, foi esquecido.

Uma república, que já foi império, vai se fragilizando. Aqui, nesta margem do Atlântico e na proximidade dos Andes. Se não houver um basta, o pior está por vir. É só esperar.

print