BOM EXERCÍCIO


Visitar Portugal é encontrar o Brasil profundo. Nunca pai e filho mostraram-se tão iguais em aspecto e consciência. Os costumes portugueses, guardadas as proporções, assemelham-se aos brasileiros.

Nas questões políticas, o tratamento é idêntico. O acessório sempre é exaustivamente debatido. O principal não importa. Ele se resolve pelo tempo.

Nesta fase amarga da economia mundial, por toda a parte há depressão. Os portugueses não se apresentam diferentes. Resta sempre a incontida esperança de nossos povos.

Somos pobres, não estaremos muito piores. Afirmam autoridades lusitanas. Estão certas. Portugal, com suas notáveis descobertas, estafou-se. Tornou-se um país de comerciantes.

Errou o poeta. Na verdade, comerciar é preciso. E isto os portugueses fazem bem. À perfeição. Os reis portugueses lançaram feitorias por todo o mundo. Nada escapou à presença das caravelas guiadas pela cruz.

Mais que as conquistas territoriais, a expansão da cristandade, interessava formar uma rede de trocas dinâmica e capaz de transportar bens de todas as partes para todas as partes.

O grande entreposto comercial da Europa, na época das grandes descobertas, foi Lisboa, cidade que, ao preservar sua imagem clássica, permitiu a suave integração dos costumes de ontem com os de hoje.

Em Lisboa, encontra-se humanidade portuguesa com seus traços vitais. O lisboeta conta com uma boa cultura média. Sabe tudo e elabora visão críticas dos acontecimentos.

Fica perplexo quando constata que, no âmago da grande crise econômica, debate-se nos meios de comunicação e nas áreas governamentais, a aposição da bandeira da República ao lado dos pavilhões das autarquias.

As Forças Armadas, em seus quartéis, querem apenas o pavilhão nacional. As autoridades civis desejam ambas: a portuguesa e a da autarquia, hasteadas em níveis diferentes.

Trata-se de um tema. Outro, ainda mais debatido, coloca-se na sensível cenário do conflito de valores entre cristãos e muçulmanos. Tema difícil e capaz sempre de causar grandes efeitos.

Não é diferente em Portugal. O tema do debate centrou-se em palavras do Cardeal Patriarca de Lisboa, Dom José Policarpo. Consta que se trata de um prelado simples e humano. Não afeito a controvérsias.

Mas, Dom José Policarpo, em programa televisionado, entrou em situações muito intrincadas. Meteu-se na vida íntima das pessoas ou mais explicitamente na realização de casamentos inter-religiosos.

Foi direto ao assunto: Pensem duas vezes em casar com um muçulmano, pensem muito seriamente. É meter-se num monte de sarilhos que nem Alá sabe onde acabam.

Suas palavras causaram debate intenso. Os intelectuais – como sempre – dividiram-se. Alguns apontaram para as palavras preconceituosas do Cardeal. Outros se estenderam em analisar costumes diversos.

Resta tomar o dicionário e ver o que significa sarilho. Popularmente, indica situação difícil, encrenca, atrapalhada, discussão violenta. Quem informa é o Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa.

Mas Portugal – como seu filho Brasil – apresenta uma contemporaneidade de semelhanças incríveis. Lá, como cá banqueiros violam normas de bom procedimento e são salvos pelo Estado.

Um processo judicial demora muitos anos para atingir seu fim. Caso exemplar é o que gira em torno da Casa Pia. Pessoas influentes teriam abusado de menores internados nesta antiga instituição.

O processo se arrasta e tudo indica que os réus serão absolvidos. O processo penal e civil, nas duas extremidades do Atlântico sul, é complexo e se coloca como um refúgio da má-vida.

Os professores dos liceus se encontram em estado de greve. Não querem se submetidos a avaliação exigida pelo Ministério da Educação. Viola o ato a dignidade dos mestres. Protestam.

Todo o brasileiro deveria, obrigatoriamente, a cada temporada ir a Portugal e entrar em contato com sua gente e seus costumes. Entenderia melhor a si próprio e ao Brasil.

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