CAMPANHA ELEITORAL E A FARSA


Hoje, em todo o Brasil, inicia-se a campanha eleitoral pelo rádio e televisão. Uma notável massificação de imagens e algumas poucas mensagens relevantes.

Eleições municipais inserem-se entre as mais remotas das manifestações políticas nacionais. Desde 1532, quando os portugueses fundaram São Vicente, no litoral paulista, praticam-se pleitos comunais.

Alguém poderá objetar. Os pleitos regidos pelas Instituições do Reino abrigavam apenas o voto censitário, isto é, o voto dos que possuíam propriedades ou rendimentos. Ou em linguagem da época, os homens bons.

A crítica é infundada. Os sistemas eleitorais, naqueles tempos, contemplavam exclusivamente o voto das elites econômicas. O povo só muito – muito mesmo – mais tarde passaria a eleger seus representantes.

A democracia, em nenhuma parte, atinge a extensão existente hoje no Brasil. A amplitude do colégio eleitoral ativo, aquele formado pelos eleitores, é imensa no nosso cenário político.

A partir dos dezesseis anos e sem qualquer limite de idade, mulheres e homens votam com igual peso e sem obstáculo de qualquer natureza.

A democracia brasileira acolheu entre seus postulados as melhores lições da Ciência Política. O voto, por aqui, é universal, compreendendo toda a cidadania. É exercitado de forma secreta.

É, pois, confortável a posição da democracia brasileira em comparação aos demais países. Não há ressalvas a serem apresentadas quanto à nossa mecânica eleitoral.

Se assim é, onde estão os erros? Eventualmente, na forma de financiamento das campanhas eleitorais. Pergunta-se: este deve ser público ou privado? Resposta difícil.

Em princípio, o sistema brasileiro atinge as necessidades da prática política. Os partidos recebem recursos do Fundo Partidário, o que permite a manutenção de suas atividades rotineiras.

As campanhas – assim como a manutenção dos partidos – admitem doações de particulares. Completam-se, assim, com sabedoria, as condições da atividade política. O Estado suporta a atividade partidária. Os particulares, as campanhas dos candidatos.

No entanto, quando se inicia o horário gratuito – ou guia eleitoral – no rádio e televisão, cuja transmissão também é suportada pelo Estado, cabe examinar-se o tema a partir de outros e variados ângulos.

Ninguém discute a oportunidade da propaganda eleitoral pelos meios eletrônicos. Populariza os candidatos e permite a estes oferecer seus programas de governo.

O mal fica por conta da imaginação dos postulantes e dos operadores de campanhas. O rádio e a televisão destinam-se a difundir as atividades partidárias. As mensagens dirigidas pelos candidatos ao eleitorado.

Aqui a deformação. Os candidatos deveriam expor pessoalmente seus planos de governo. Com clareza e precisão, mesmo quando limitados a pequenos espaços de tempo. Nada de terceirização.

Os malabarismos imaginados pelos marqueteiros de plantão podem ser úteis à divulgação de produtos comerciais. Jamais para expor personalidades que pretendem ser líderes de suas comunidades.

Seria oportuno que membros do Poder Judiciário, titulares de funções judicantes, examinassem a propaganda eleitoral à luz da legislação existente e das boas práticas democráticas.

Nas transmissões de maior duração, apenas a presença do candidato, expondo suas idéias, seria o ideal. Nada de pirotecnias. Vinhetas enganosas. Mistificações. Farsas.

O eleitor já se encontra avisado. Ainda assim, seria útil a análise do tema pelo Poder Judiciário Eleitoral. Prestaria a jurisdição especial serviço à democracia se pusesse fim à deformação presente nas campanhas eleitorais.

Muitos candidatos sem qualquer conteúdo atingiram postos eletivos graças a mistificações elaboradas por técnicos em comunicação. Os eleitos, desta forma, segundo crônicas, poucas vezes têm se demonstrado bons cidadãos.

Uma decisão do Judiciário Eleitoral e uma audiência crítica da cidadania poderão permitir, a partir da campanha que hoje se inicia, no rádio e na televisão, uma salutar melhoria nos hábitos políticos.

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