COSA NOSTRA


O Senado da República sempre mereceu consideração da sociedade. Apresentava-se como a casa parlamentar da moderação e da sobriedade. Seus integrantes espelhavam compostura.

Esta é a imagem do Senado para os observadores de muitos anos atrás. Via-se, na Câmara Alta, um grupo de políticos experimentados e capazes de intervir em horas de crises.

Verdadeiras figuras de Plutarco, aquele que descreve os grandes homens da Antiguidade Clássica. Tudo isto foi ontem. Agora, o Senado da República dá péssimo exemplo de desrespeito à Constituição.

Muitos dos ocupantes de cadeiras no Senado foram, em passado recente, constituintes e colaboraram na elaboração da Constituição de 1988, o documento da cidadania.

Tudo em vão. Uma amnésia profunda tomou conta da mente e da consciência de muitos senadores, particularmente daqueles que, desde 2001, participam da Mesa Diretora dos trabalhos.

A direção e a administração do Senado competem a sua Mesa Diretora. A condução da Alta Casa, portanto, opera por órgão coletivo. Quando ocorre um erro, este não pode ser atribuído a um senador, mas ao coletivo dirigente.

Esta Mesa Diretora, no entanto, de há muito, fere a Constituição sem qualquer pudor. A Casa tornou-se um clube fechado, exclusivo. Os seus membros fazem o que querem.

São oitenta e um parlamentares, representantes dos estados federados, que não se importam com as conseqüências de seus atos e muito menos com as regras contidas na Constituição.

Entre as normas constitucionais, apresenta-se uma que não permite dúvidas. Trata da Administração Pública. Deve ser cumprida pelos três Poderes. Não há exceções.

Este dispositivo constitucional é preciso: a administração pública obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Ao nomearem parentes, amigos e afins, por meio de atos secretos, o Senado agrediu diretamente a Constituição. Agiu, por sua vez, contra a legalidade, ao permitir nomeações sem concurso.

Não mostrou impessoalidade ao escolher parentes e amigos. Rompeu com a moralidade ao agir contra preceitos comuns de bem viver. Feriu a transparência ao não publicar os atos de nomeação. Tem demonstrado ineficiência.

Não é pouco. Apesar disto, alguns senadores posam como grandes personalidades. Acham-se privilegiadas. Não aceitam críticas. O Senado tornou-se propriedade privativa de uns poucos.

A opinião pública não importa. A Constituição existe para os outros. Os bons princípios integram mero catálogo para ingênuos. Estes senadores oferecem um triste espetáculo para a cidadania. Rasgaram o documento que juraram observar.

Aquela, atônita, assiste mais um disparate elaborado e praticado por políticos. No entanto, não há reações na Casa maior do parlamento brasileiro. Parece não ter ocorrido absolutamente nada.

O cinismo torna-se revoltante. Nenhuma palavra de censura. Nenhum gesto de desacordo. Todos estão de acordo com o sucedido. É assim por que eles querem. Assim será.

A cidadania – lançada a desterro cívico – espera do Ministério Público Federal um ato de afirmação. Tudo não pode passar impune. A democracia exige respeito à lei e ao diploma maior.

Passaram-se dias. Os movimentos mostram-se lentos. Deseja-se das autoridades de fiscalização pronto agir. Não dá mais para esperar. Alguém deve responder pelas atitudes inconstitucionais e imorais.

Há um cansaço no ar. Uma fadiga cívica. Os senadores praticaram e conheciam os atos secretos. Os integrantes da mesa dirigente do Senado por provocação ou por homologarem são co-autores.

Não pode passar em branco. A preservação de segredos grupais é própria da criminalidade organizada. O Senado não pode baixar a nível tão execrável. Providências devem ser adotadas.

Os membros isentos da Casa devem agir. O Ministério Público Federal atuar. A cidadania registrar os nomes dos agentes da violência contra os costumes e a Constituição. As eleições estão próximas. Falta apenas um ano.

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