NO RECESSO, AGUARDA-SE O MINISTÉRIO PÚBLICO


Graças a Deus o recesso chegou. Os últimos tempos foram devastadores. As casas do Congresso passaram por situações inacreditáveis. O Senado Federal superou-se. Foi além da imaginação do mais criativo autor de novelas de horror.

Rompeu limites constitucionais. Esqueceu-se do sadio princípio da publicidade. Preceito fixado com rigor na Constituição da República. Avançou nos descaminhos do segredo. Criou os atos secretos. Excrescência inaceitável em uma democracia.

A democracia possui alguns postulados. Dentre eles, aflora a obrigação de transparência em todos os assuntos públicos. Nada pode ser secreto. Tudo deve correr às claras. A cidadania – como empregadora – tudo deve conhecer.

Nada pode ser mantido obscuramente. Só os maliciosos admitem assuntos públicos reservados. O Senado, neste passo, foi além do permitido. Feriu a legislação e mostrou-se agente da improbidade.

A opinião pública acompanhou perplexa todos os acontecimentos. Diretores transformados em chefes de grupelhos. Senadores acobertando o inconcebível. Nomeações a mão cheia. O nepotismo em todos os graus.

Todo este cenário entristeceu os cidadãos honrados. Aqueles que labutam de sol a sol para sustentar suas famílias. Os que jamais conseguiram viagens graças aos cofres públicos.

Estes – aparvalhados – sentiram-se frágeis e muitas vezes lamentaram o voto que concederam em eleições passadas. Desacreditaram na própria democracia. Sentiram impulsos antidemocráticos.

Um erro. A democracia – o melhor dos regimes – é que permitiu o conhecimento das falcatruas cometidas pelos congressistas. Em regimes autoritários ou totalitários, o pior se verifica e os aparelhos de censura a tudo escondem.

Esta a primeira reflexão exigida pela atualidade política. Deve-se comemorar a presença de meios de comunicação livres. Estes permitiram o pleno conhecimento dos atos e fatos desenhados nos escaninhos congressuais.

Pior seria a ausência da plenitude de informação. As aparências seriam confortáveis, mas a realidade escamoteada conduziria a fragilização de todos os mecanismos governamentais.

O Brasil já conheceu ditaduras – e muitas – quando do retorno à luz, as instituições encontravam-se em farrapos. A moralidade pública lançada à sarjeta. Recompor a normalidade foi longa trajetória.

Ainda mais. Apesar de toda parafernália de golpes baixos proferidos pelos congressistas, em nenhum momento correu a idéia de rompimento do funcionamento normal das instituições.

Esta a grande conquista. Em épocas passadas, sempre surgia ave de mau agouro a pregar golpes de Estado. O rompimento da legalidade. Poucos lutavam pela preservação das instituições e da própria democracia.

Este recesso permite observar nova forma de encarar os desatinos. As próprias instituições com seus mecanismos recomporão a moralidade e atingirão os objetivos para que foram criadas.

Este o grande ganho destes últimos vinte anos. A Constituição de 1988 permitiu uma nova visão dos mecanismos de Poder. Já não se apela para a falácia do “fechamento” das casas parlamentares.

Todos desejam a qualificação dos costumes políticos e sabem que isto só pode ocorrer mediante a manutenção dos valores democráticos. Por isto, espera-se o decidido ingresso do Ministério Público Federal na busca dos ilícitos cometidos.

Com a ampliação de suas atribuições, o Ministério Público tornou-se um organismo apto a combater a imoralidade em todos os seus aspectos. Não pode a instituição se omitir em momento de presença indispensável.

Os organismos internos dos parlamentos sofrem da inevitável presença do corporativismo. A convivência diuturna torna os parlamentares reféns das emanações das amizades espontâneas.

Dai a necessidade de um órgão externo repor a normalidade, onde só se conhecem descalabros. Silenciar neste instante é agir contrariamente à democracia. Frustrar o constituinte de 1988.

Este conferiu ao Ministério Público a incumbência de defender o regime democrático. Este, pois, não pode abdicar desta relevante incumbência. Ela é nobre e essencial à preservação do Estado de Direito.

No decorrer do recesso parlamentar, aguarda a cidadania um agir efetivo dos agentes do Ministério Público para repor o Senado Federal em sua alta posição na estrutura do Estado.

O Senado, em sua longa História, sempre se mostrou vocacionado a agir como uma Casa de moderação. Não pode sua imagem ser violada por representantes sem qualquer respeito à causa pública.

Dentro da lei, a sociedade exige resposta. Certamente, um ente externo poderá atuar com mais liberdade e desenvoltura. Aguarda-se um posicionamento efetivo desta instituição que, a partir de 1988, teve suas atribuições ampliadas. Para o bem de todos.

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