NUDEZ DO PENSAMENTO


É sempre gratificante ler as narrativas dos viajantes que visitaram o nosso País desde sua descoberta pelos europeus. O espanto registrado perante os costumes dos povos indígenas é extraordinário.

A discrição das belezas e riquezas da Terra são comoventes. Vinham os viajantes de sociedades estabilizadas e repletas de conceitos e preconceitos.
Tudo era proibido lá nas terras de origem. Aqui, tudo – ou quase tudo – era acessível. Bastava estender as mãos e os frutos silvestres eram colhidos.
A nudez de mulheres e homens, correndo livremente, apontava para uma terra sem pecados. Um verdadeiro paraíso terrestre. Apesar dos esforços dos religiosos aportados, o bom pecado tomou conta dos corpos.
Anchieta conta que os órfãos que conduziu a São Paulo, a partir do longínquo Portugal, embrenharam-se nas matas em companhia de índias. Nunca mais voltaram.
Certamente, foram felizes, mesmo que tenham morrido atacados pela peçonha dos animais silvestres. O fantástico sempre esteve presente na trajetória da nossa sociedade.
Viveu e vive-se intensamente. O trópico possui luz e profusão de cores. Os viajantes tinham porque mostrar estupefação. O novo envolvia todo o ambiente.
Nada se parecia à velha Europa, repleta de pestes e dogmas. A liberdade natural imperava nesta parte do hemisfério. O bom selvagem mostrava sua superioridade perante o branco cheio de traumas.
Foi assim e continua sendo assim. Ainda hoje o viajante chega ao Brasil e não entende nada. Repleto de visões preestabelecidas, critica os costumes e as contingências locais.
No momento, a moda de pessoas de diversas origens, de passagem por estas terras, é criticar o televisionamento das sessões do Supremo Tribunal Federal.
Apontam para os desgastes produzidos pelas ásperas contendas entre magistrados. A Justiça é intocável. Os juízes não podem ser expostos. Não devem expor suas fragilidades.
Posições próprias de hipocrisia profunda que apresentam muitos povos, particularmente do Velho Mundo. É bom – é mais do que bom – é melhor que os julgadores se exponham como seres humanos.
O Poder Judiciário deve ser respeitado, mas não deve ser sacralizado. Os juízes – mulheres ou homens – são humanos. Por isto, passíveis de todas as contingências próprias da humanidade.
A televisão, ao vivo e direta, serve como fiscal coletivo da atividade judicante. Explosões de humor ou tirados de inteligência apenas apontam para a personalidade de cada juiz.
Ainda, como ponto positivo, a transmissão dos julgamentos pela televisão permite uma educação espontânea para a cidadania. Ontem, apenas o julgamento dos fracos era exposto pela mídia.
Agora, empresários e políticos de renome são expostos. Seus defensores apresentam suas defesas. Toda a cidadania acompanha com interesse. Debate e discute o que vê e o que ouve.
Há muitos críticos dos hábitos nacionais – é constante secular. Agora, o civilizado aprecia mostrar seu desprezo pelo que assiste na TV Justiça. Como pode o Judiciário se expor desta maneira?
Os pioneiros sofrem com suas inovações. A transparência absoluta dos julgamentos é uma conquista notável dos brasileiros. As críticas são próprias de quem não está acostumado à verdade exposta.
É preciso coragem cívica para concretizar a transparência alcançada pelo Judiciário brasileiro. Dar total publicidade para os atos do processo, particularmente em cortes formadoras de jurisprudência qualificada.
Aqui a nudez é um atributo constante. Do corpo ou do pensamento, tal como se faz hoje no Supremo Tribunal Federal.
print