NOSSA AMÉRICA


A nossa América, a América ibérica, é repleta de situações peculiares. Herdeira de duas sociedades fortemente burocratizadas – Portugal e Espanha – não consegue se libertar de seus atavismos.

O absolutismo tardio sofreu transplante para estas plagas. Permanece constante nos atos e atitudes de seus governantes. Basta olhar para o próprio País ou para o seu vizinho. A realidade se constatara.

São situações inteiramente extravagantes. Avoengas. Ainda agora, na Venezuela, o presidente da República autoriza saque às lojas de eletrodomésticos. Todo venezuelano deve possuir televisão em suas casas.

Não um aparelho qualquer. Tem que ser de última geração. Para atingir seu objetivo, o mandatário buscou o apoio das Forças Armadas. Organizaram as ações populares.

É no mínimo desconcertante. A autoridade incentivar a insegurança coletiva. A desculpa é precisa: todo comerciante é predador. Conseqüência: os supermercados se encontram com as prateleiras vazias.

Difícil será repor os estoques no clima criado. Ninguém mais confia na segurança pública. Além disso, as reservas monetárias se esgotam, em País que importa a maioria dos bens de consumo.

Assim acontece na Venezuela, herdeira de tradições advindas das guerras da Independência. Coloca-se, nestas, elemento altamente significativo.

Bolívar, o libertador, foi autor de uma idéia hibrida. Propôs, em projeto de Constituição, um presidencialismo vitalício.

Exatamente isto. O regime seria presidencialista e republicano. O presidente, como nas monarquias, vitalício. Uma figura constitucional que, pelas Américas, seria do agrado dos governantes.

Basta recordar as infâmias cometidas para implantar a reeleição aqui no Brasil. Usaram todos os artifícios da má política para atingir este desejo do monarca republicano de então.

Neste continente repleto de luz e verde, os habitantes esquecem com facilidade as ignomias praticadas por seus governantes eleitos ou impostos por golpes de força.

Esta afirmação terá, agora, bom momento para se tornar evidente ou ser negada. Os condenados do mensalão foram expostos universalmente em sua posição de prisioneiros.

O julgamento se deu com plena transparência. Todos tiveram oportunidade de oferecer suas defesas e, quando possível, recorrer até o julgamento definitivo.

Como reagirá a sociedade? Nesta América ibérica – especialmente a portuguesa – o passado não condena ninguém. Mas, ao mesmo tempo, não existem heróis a serem homenageados.

Os brasileiros têm uma profunda capacidade de esquecer. Convivem com as mais incríveis dificuldades. Não se comovem ao ver os condenados do mensalão transportados em avião oficial.

Sabem que, diariamente, presos são conduzidos em camburões infectos. Sem ar, em condições desumanas. Não vão se apiedar por alguns políticos, alguns publicitários e uns poucos banqueiros pegos com a boca na botija.

A melhor constatação desta verdade é a ausência de manifestações populares em defesas dos presos pela pratica do mensalão.

Na América ibérica, as práticas inquisitórias se encontram presentes em sua História. Um auto de fé eletrônico – executado pela televisão e pela internet – substitui com perfeição aqueles realizados no Rocio lisboeta ou nas velhas praças públicas da Espanha.

Esta América pouco combate a corrupção, quando o faz é com espetacularização exemplar.

Faz parte de suas tradições mais profundas.

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